por Jairo Máximo

Ilustração: Castilho / Arquivo Blog do Pícaro
55 PUNHALADAS PATAFÍSICAS DE PÍCARO
Por Fernando Castelló*
Jairo Máximo, jornalista e/ou pícaro brasileiro radicado no pátio do Monipodio** madrilenho nos oferece neste livro uma série substanciosa de até 55 entrevistas “patafísicas”.
Esclareçamos rápido que pícaro significa em espanhol pessoa não isenta de simpatia que nos engana com habilidade e destreza. E que a patafísica, inventada pelo dramaturgo francês Alfred Jarry na sua obra satírica Ubu Rei, é a ciência matemático/poética das soluções surrealistas para problemas imaginários.
Sim. Ao Jairo, o termo pícaro, no bom sentido humorístico da palavra, lhe cai bem, além de ter sido o fundador e animador, já faz um quarto de século, do jornal humorístico Pícaro [1984-1988], que levantou ventos de humor negro em São Paulo. E o de patafísico, melhor, porque ele é um poeta ubuesco que vai mais além do realismo habitual nas suas penetrantes entrevistas, nas quais suas perguntas lancinantes, nunca cruéis, são como um ferrão de uma vespa acupunturista que provocam às vezes respostas irritadas, ainda que nunca estúpidas.
Jairo, humilde, faz perguntas breves, quase em “off”, e sai de cena, deixando todo o espaço às respostas, como deve ser e nem sempre é, pois muitas vezes e frequentemente o jornalista entrevistador esmaga com seu ego ao do entrevistado e aparece como se entrevistasse a si mesmo pela boca de outro.
Jairo, não. Atua como um simples saca-rolhas para tirar a rolha/língua de seu entrevistado e lhe forçar, como a um líquido de grande reserva, a despejar toda a potencialidade embriagadora que guardava a sete chaves dentro.
Suas 55 entrevistas transatlânticas de tumba aberta (nunca melhor dito, pois alguns dos entrevistados já estão mortos) estendem-se, como uma grande ponte entre Brasil e Espanha, desde 1981 aos dias de hoje. Uma ponte verbal que se inicia em São Paulo com um jovem sindicalista recém-saído da cadeia por incitar greve e chamado Luiz Inácio Lula da Silva (conhecem?) e desemboca em Madri com Gervasio Sánchez, o grande fotógrafo e jornalista espanhol do conflito humano.
Seus pilares de sustentação passam pelo Ubu Rei brasileiro, uma prostituta respeitosa sartriana, um ex-guerrilheiro que amou tanto a revolução; o ladrão Dioni, os jornalistas espanhóis Juan Luis Cebrián, Maruja Torres, Carmen Gurruchaga; os italianos Leo Bassi e Antonio Tabucchi; músicos, filósofos, mambembes, políticos (esses cômicos da língua), humoristas de ambos os lados do brejo…
Contradizendo a seu entrevistado Paulo Leminski, quando este lhe disse que “ninguém consegue melhorar a forma do ovo e nem o gosto da água”, Jairo, picarista e “picareta” intensional, em suas entrevistas patafísicas transforma a forma do ovo, cortando-a pela sua base e plantando-o como o de Colón, melhora o sabor da água das declarações, às vezes sem gosto e deprimente, enriquecendo-a com o uísque de suas anotações de rodapé. E já se sabe que, contra a deprê vital, nada melhor que o áureo elemento euforizante. Etiqueta neura, claro, como esta que nos oferece Jairo em seus 55 tragos. ●
*Fernando Castelló (Valência, 1937 – Madrid, 2013) jornalista, escritor e presidente internacional da Repórteres sem Fronteiras (RSF). Escreveu este texto em Madri no dia 29 de maio de 2008 para a publicação do (gorado) livro A Tumba Aberta.
**Pátio de Monipodio é uma expressão usada pelo romancista, dramaturgo e poeta espanhol Miguel de Cervantes (1547-1616) que o situou em Sevilha, na novela Rinconete y Cortadillo. Era o lugar onde pessoas em situação de miséria criavam estratégias para sobreviver, inclusive pequenos roubos.●

Ilustração: Castilho / Arquivo Blog do Pícaro
ENTREVISTADOS
26) Caetano Veloso e Gilberto Gil
32) Dionisio Rodríguez Martín (El Dioni)
Texto en español: 55 Puñaladas Patafísicas de Pícaro