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A avenida Gran Via de Madri vazia no sábado 14 março.

        “O detalhe me serve como ponto de partida para uma reflexão generalizada” (Ryszard Kapuściński)

Por Jairo Máximo (texto e fotografias)

Madri, Espanha – (Blog do Pícaro) – A Espanha vive uma emergência sanitária e aproxima-se de uma crise econômica sem precedentes. Olhe por onde olhe é só incertezas. Vivemos em um estado de alarme. Resistiremos!

Pouco antes de o governo decretar o estado de alarme ansiávamos pela chegada da primavera: o renascimento.

Estava trabalhando em dois artigos jornalísticos. Um sobre o magnífico livro Akinori Nakatani Sua obra e sua vida, publicado recentemente no Brasil, que começava assim: “A perseverança do ceramista contagia”. O segundo texto era uma resenha cinematográfica do filme “A candidata perfeita”, da diretora saudita Haifaa Al Mansour, titulado “A esperança está em vocês”.

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Signos de preocupação. Entre janeiro e fevereiro passado me chamou muito a atenção que nas portas dos comércios da colônia chinesa, no centro de Madrid, onde moro, era possível encontrar este aviso: “Fechado temporariamente por férias. Desculpe pelos transtornos. Obrigado”. Conhecendo um pouco como pensam os chineses, intuí que este aviso poderia ser uma metáfora. Fechado pelo que pode passar. Olhem o que está acontecendo na China. Entretanto, a vida em Madri continuava com seu ritmo normal de uma cidade cosmopolita e turística.

No dia de 12 de março, quando tomei um ônibus, o motorista, com luvas de plástico azul, me perguntou: Você não tem cartão de transporte? Respondi: Sim, mas está sem crédito. Aqui está o dinheiro para pagar a passagem. Ele me respondeu: “Não é preciso pagar. Sobe”. Nos 15 minutos que durou o trajeto até meu destino, fui o único passageiro. Que estranho, pensei… Foi neste momento que pressagiei que as coisas iam ficar feias, muito feias. Vinte e quatro horas depois o governo decretaria o estado de alarme e os 47 milhões de espanhóis ficaram atônitos. A destruição −imprevisível− que o Covid-19 ia fazer em nós era palpável.

Fomos incapazes de prever o que se aproximava. O distanciamento social neste momento é uma realidade. Fechado por luto.

Vírus global. Os primeiros casos registrados de coronavírus, da Covid-19, foram detectados em dezembro de 2019 na cidade de Wuhan, capital de Hubei, na China. No dia 20 de janeiro, Pequim reconheceu o contagio entre pessoas e o 23 deste mesmo mês impuseram uma quarentena a toda Hubei e, em menor escala, a muitos outros lugares do gigante asiático. Em fevereiro, foram detectados os primeiros casos na Espanha.

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A rua Flor Alta de Madri durante a quarentena.

Todos em casa. Sábado 13 de março. Primeiro dia de confinamento. Amanhecemos em estado de choque. Desconcertados. Vou até a Avenida Gran Via, ao lado da minha casa, comprar os jornais do dia e aproveito a ocasião para fazer algumas fotos da emblemática avenida deserta. No dia seguinte, faço a mesma coisa e aproveito para comprar algumas coisas básicas no supermercado. Durante o trajeto faço outras fotos do meu agitado bairro turístico totalmente vazio. Sem uma alma viva na rua. A partir da segunda-feira, dia 16, não abandono mais minha casa para NADA, até hoje.

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Rua Do Barco de Madri durante a quarentena.

20 horas. Depois de oito dias e noites de confinamento, diariamente desejo que chegue às 20 horas para sair à sacada do apartamento e aplaudir em companhia dos vizinhos, os nossos heróis, os trabalhadores dos hospitais e a todos aqueles que continuam trabalhando para que possamos continuar vivendo. É neste momento que me emociono e aplaudo com todas as minhas forças. Obrigado, obrigado e obrigado.

Nono dia. Hoje 23 de março é o nono dia de confinamento. Nestes momentos Europa é o epicentro da pandemia, com Itália e Espanha no topo.

Lembro. Foi no dia 17 de fevereiro passado quando escrevi para uma amiga mogiana: “É preocupante o que está passando na China. Já afetou a economia mundial. A maioria dos chineses que moram em Madri, e que estiveram na China durante o Ano Novo deles (em janeiro) estão de quarentena. Eles são super disciplinados. É admirável. E como estamos falando da China, que não é um país transparente, na realidade não sabemos o que está acontecendo. Espero que encontrem uma vacina urgentemente”.

Última hora. Até o momento (29 de março), a Espanha conta com 78.797 contagiados, 6.531 mortos e 14.709 recuperados. Entre os contagiados estão mais de 10.000 profissionais de saúde. Segundo o balanço global atualizado hoje pela Universidade Johns Hopkins, dos EUA, existem 666.718 pessoas contagiadas no mundo, das quais 31.196 morreram e 143.352 recuperados. E isto vai aumentar…

Grito de sobrevivência na Espanha. Resistiremos!

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A praça Santa Maria Soledad Torres Acosta de Madri durante a quarentena.
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A rua São Bernardo de Madri durante a quarentena.